Coredump: meu velho amigo
Parece piada, mas tem um fundo de verdade
Lá pelos idos de 2002 eu passei dois meses e meio nos EUA a trabalho. O que era para ser um treinamento virou um pesadelo, assunto para outro artigo no meu blog. Dentre as poucas quinquilharias que comprei por lá está o passarinho da foto: uma gaivota com dor-de-barriga. Apelidei este passarinho de Coredump e desde então é meu companheiro nas horas insólitas de programação de computadores.
Este passarinho sempre esteve comigo desde então, em cima do monitor, na mesa, não importa. Ele é uma lembrança do quanto eu preciso esmerar-me ao escrever código para evitar de sentir as dores que os bugs de código mal escrito causam. Porém, o Coredump tem uma finalidade ainda mais interessante: a de ouvinte.
Coredump: uma gaivota com dor-de-barriga
Sempre que esbarro com algum problema cabeludo para resolver, eu explico o problema para o Coredump. Muita gente que testemunhou o fato me taxou de maluco por conversar com um passarinho de pelúcia com dor-de-barriga. Mas existe um motivo muito interessante por trás disto — além da insanidade mental, claro.
O Prof. Dr. Cláudio Leonardo Lucchesi, uma pessoa que tenho o privilégio de chamar de amigo e mestre, uma vez me explicou o Princípio Teddy Bear e como ele fazia com os alunos dele, na época na Unicamp, para aplicar este princípio. Compartilho aqui os ensinamentos dele.
Ao início do semestre, ele pedia aos alunos que comprassem um ursinho de pelúcia, ou um bichinho qualquer que lhes fosse adequado. Não precisava ser um Lots-o-hugs caríssimo. Qualquer bichinho estava valendo. Sempre que os alunos esbarravam com algum problema complicado sem solução, ele pedia que explicassem o problema para o ursinho, procurando detalhar ao máximo a explicação.
A lógica por detrás disso é interessante: a nossa cabeça é uma bagunça de pensamentos. O pensamento ocorre várias vezes mais rapidamente do que conseguimos articular a fala. Ao explicar algo para alguém, estamos ordenando as ideias na cabeça de forma a articular a fala, o que nos faz parar para avaliar aspectos do problema que não havíamos parado para avaliar dada a velocidade em que os pensamentos ocorrem.
Assim, todo o caos que existe dentro da mente ordena-se de forma a focar-se na explicação. Na verdade, estamos explicando para nós mesmos o problema e, muitas vezes, acabamos analisando a questão por ângulos muito diferentes do que havíamos considerado inicialmente. Isto é efeito da ordenação dos pensamentos no intuito de articular a fala.
Da mesma forma, psicólogos indicam a escrita para o tratamento da ansiedade. Escrever um diário, por exemplo, exercita a mente, tornando-a mais disciplinada. Assim os problemas mais complexos ganham soluções simples — tudo por que você pagou de doido e conversou com um bicho de pelúcia.
Antes de conhecer o professor Lucchesi eu já falava com o Coredump. Na verdade, de maneira intuitiva pois era obrigado a virar noites e noites para resolver problemas cabeludos em produção. Ao conhecer o professor Lucchesi, anos depois, aprendi a técnica, muito simples, de conversar de forma mais estruturada com o Coredump. Isso me ajudou de maneira positiva ao programar.
Antes de terminar este artigo gostaria de deixar registrado aqui o meu apreço pelo gigante Cláudio Leonardo Lucchesi. O Brasil precisa de gente como ele, um educador nato, uma pessoa que não tem pudor em transmitir seu vasto conhecimento.