Ronaldo
Ronaldo Desenvolvedor, pai, cidadão do mundo.

O espião de empregados

Por que a privacidade e as boas condições de trabalho são importantes.

O espião de empregados

Pode parecer piada, mas muitas empresas ainda vivem no Século XIX. Ao decidirem o leiaute dos escritórios, o fazem de tal forma que o gerente possa espiar o monitor dos empregados sem esforço. Outro caso comum é o do e-mail corporativo que é único para todo um setor, tirando a individualidade de cada empregado frente aos clientes. Mais ainda, o empregado usa uma senha única para acessar sua estação de trabalho, senha fornecida e controlada pelo gerente que pode, a qualquer momento, acessar sua máquina para ver o que você está fazendo.

Isso não é piada. Isso acontece nas empresas e com bastante frequência. Ao negar a privacidade ao seu empregado você instala um modelo de administração baseada no medo. Existe uma desconfiança de que o empregado não fará o serviço e, por este motivo, o patrão acaba monitorando o que o empregado anda fazendo com os recursos que lhe são confiados.

Ora, se não há confiança, por que manter o empregado em primeiro lugar? Mesmo com essas medidas descabidas de monitoramento, uma pessoa mal-intencionada é capaz de roubar informações da sua empresa bem debaixo do seu nariz. O fato é que se você não confia na pessoa que contratou está correndo risco ao mantê-la no seu quadro de profissionais. Monitorar o que essa pessoa faz é tão inútil quanto uma foto de água para alguém que está morrendo de sede no deserto.

É preciso estabelecer-se uma relação de confiança com os seus empregados. A proteção dos seus interesses pode ser estabelecida com um contrato de trabalho bem feito e com a adição de um acordo de confidencialidade. Simples assim. Essa neurose de ficar olhando se o empregado está no Facebook ao invés de trabalhar é descabida. O empregado tem prazos e precisa entregar o trabalho que está executando. Se ele entrega depois do prazo, é importante questioná-lo, avaliá-lo e, quem sabe, demiti-lo se acaso ele esteja consistentemente atrasando todas as entregas e causando prejuízos.

Limite a internet e tenha sua produtividade limitada

Outra coisa muito comum é limitar o uso da internet. Várias empresas gastam fortunas verdadeiras com proxies no intuito de evitar que os empregados acessem determinados sites. O resultado? Queda de produtividade.

A internet é uma ferramenta de trabalho como outra qualquer. No entanto, muita gente supõe que os empregados sabem usar a internet. Aqui o ponto é educação: nem todo mundo sabe como tirar o maior proveito da internet. É neste ponto que o treinamento corporativo é essencial. De nada adianta dar o martelo na mão de uma pessoa que não sabe o que é um prego.

A educação é algo contínuo e deveria ser oferecido, também, pelas empresas. A ideia é formar pessoas dentro da cultura corporativa, compartilhando conhecimento e aumentando, assim, o capital intelectual da empresa que é, em última instância, o maior tesouro que toda empresa possui. Sem educação adequada o empregado fica no Whatsapp batendo papo, publicando fotos da última viagem que fez, lendo besteiras, jogando games ao invés de trabalhar.

Crie um ambiente divertido

Não sei por que motivo as empresas preferem um ambiente opressor do que um ambiente divertido para trabalhar. É quase como se o ambiente de trabalho fosse um castigo ao empregado. Isso não deveria ser assim, pois passamos pelo menos 1/3 do nosso dia dentro do escritório, trabalhando.

Existe uma instituição do medo dentro das empresas que faz com que o ambiente de trabalho seja pesado, desagradável e que faz você acordar de manhã pensando: putz, vou ter de ir naquela porra.

Isso deveria ser o contrário: o ambiente de trabalho deveria ser mais amistoso, mais agradável e, por que não, mais divertido. Isso ajuda a minimizar a pressão das responsabilidades do dia-a-dia e faz com que o empregado trabalhe mais satisfeito e com menor estresse.

O estresse é um problema sério que só agora começa a chamar a atenção dos empresários. Eu testemunhei, durante minha vida profissional, pessoas perdendo a sanidade mental, desenvolvendo algum tipo de distúrbio psicológico e, até mesmo, morrendo por conta do estresse. E também já fui vitimado pelo mesmo.

O empregado estressado precisa usar mais tempo para fazer a mesma coisa que faria na metade do tempo se não estivesse estressado. A produtividade cai vertiginosamente. Quem está descansado e alegre com o que faz produz muito mais, usa menos tempo e ainda entrega com maior qualidade. Ter um ambiente leve e divertido ajuda muito nisso.

Bons artesãos usam boas ferramentas

Outra coisa comum nas empresas é a aquisição de equipamentos de baixa qualidade para que o empregado execute sua tarefa. Não é incomum uma empresa na qual computadores mal especificados chegam nas mãos dos empregados. Em uma certa empresa onde trabalhei, por exemplo, compraram computadores péssimos para o time de desenvolvimento: monitores de 14” e máquinas cuja placa de vídeo conseguia fazer 800x600 pontos (na época 17” e 1024x768 já eram padrões). O detalhe é que o módulo on-line que era fabricado pela empresa exigia uma resolução mínima de 1024x768.

Qual o resultado dessa especificação bizarra? Baixa produtividade, baixa qualidade e um time de desenvolvimento desmotivado. Não adianta querer qualidade se o equipamento deixado na mão do seu empregado é daquele baratinho. Isso gera desmotivação e termina por gerar um grande turnover na sua empresa. Várias pessoas pensam assim: vou deixar aquele equipamento caro na mão desse cara? Já que você considera que o cara não tem qualificação para usar o equipamento, por que o contratou afinal de contas?

A função sua, enquanto gerente de pessoas, é facilitar o trabalho das pessoas que gerencia e não mandar que façam o que precisa ser feito. As pessoas sabem o que precisa ser feito. Porém, precisam ter condições adequadas de trabalho.

Não mate a inovação

Ao desrespeitar a privacidade dos seus empregados e ao instalar uma cultura de trabalho baseada no medo, você simplesmente mata a inovação dentro da sua empresa. O seu empregado não terá coragem de assumir riscos pois teme perder o emprego. Assim, sua empresa torna-se mais uma no mercado, fazendo o que todas as outras fazem, sem inovar.

Ideias que poderiam surgir em grupos do Facebook, por exemplo, não serão usadas pelos seus empregados pois você não quer que eles usem redes sociais durante o trabalho. Novas tecnologias não serão estudadas por que a internet tem acesso limitado e os sites que contém material estão barrados no proxy da sua empresa.

Com a cultura do medo instalada, ir na sala do gerente para apresentar uma ideia ou projeto torna-se algo parecido com entrar dentro de uma cova povoada de leões famintos: você tende a pensar que terá pouca possibilidade de sair de lá vivo.