Ronaldo
Ronaldo Desenvolvedor, pai, cidadão do mundo.

Quando a discussão vira um monólogo

Ningém quer discutir. Todos querem ter razão.

Quando a discussão vira um monólogo

Você certamente já vivenciou este cenário: você expõe sua opinião em uma rede social e ao invés de haver discussão o que ocorre é desrespeito, ataques e mais ataques. Em um caso desses o que acontece é simples: todos querem ter razão. Não há troca. Há apenas a imposição de ideias. Por que chegamos a este ponto?

Uma sociedade em decadência

Antes de continuar quero deixar claro que não sou o dono da verdade e apenas expresso minha opinião, opinião esta que é formada com base na minha experiência pessoal. Ou seja, não há verdade aqui, mas um ponto-de-vista.

Isto posto, gostaria de abordar uma visão que tenho da nossa sociedade já há algum tempo: estamos em franca decadência. A sociedade moderna está vivendo a sua queda. Estamos em um momento da História, na minha leitura, na qual estamos olhando para a beira do precipício e já começamos a dar os primeiros passos para nos atirar pela borda.

As redes sociais, quando surgiram, causaram uma revolução na forma como as pessoas se comunicam. Porém, hoje, as redes sociais tornaram-se um local de imposição de ideias e de desrespeito às ideias alheias. E não é culpa da tecnologia, nem tampouco das tais redes sociais. A culpa é nossa, seres humanos. Estamos nos perdendo e vivendo a decadência de uma sociedade que valoriza cada vez mais o material, na qual o ter é mais importante do que o fazer. O conseguir é mais importante do que o construir.

Ninguém tem razão

Outro dia uma amiga expôs sua opinião em uma rede social. Foi virtualmente apedrejada. Ao invés de haver uma discussão sadia, o que se viu foi: você precisa estudar mais antes de falar esta asneira, você é uma feminista radical, ou algo como você é burra. Burra? Por que tem uma opinião formada?

Toda opinião é concebida com base na experiência de cada pessoa. Por exemplo, tenho um amigo que odeia máquinas da Dell. Ele teve toda a sorte de problemas com máquinas que comprou daquela empresa. Eu, por outro lado, nunca tive problema algum com os computadores da Dell. Inclusive, tenho um desktop que funciona há anos, mais precisamente há 8 anos, sem nunca ter dado um problema.

O meu ponto é: se você teve uma experiência negativa com uma determinada matéria, dificilmente vai ter uma boa opinião sobre, mesmo que você tenha informações que deveriam fazer você mudar de opinião.

O que existe são pontos-de-vista. O problema é o mesmo, mas quando visto por diferentes ângulos pode levar a opinião completamente diversas. Ou seja, o problema é exatamente o mesmo, mas as opiniões divergem.

9 ou 6?
9 ou 6?

Esta figurinha demonstra bem o conceito: 6 ou 9? Ambos estão certos e errados ao mesmo tempo. Hein?!

A referência faz a diferença

Para saber se um número é 6 ou 9 é preciso saber qual lado é o de cima e qual é o de baixo. Se você toma como referência o seu ponto-de-vista, você pode afirmar que trata-se de um número 6. Mas outra pessoa, que tomou para si outra referência, irá afirmar veementemente que trata-se do número 9.

O problema da referência é que nem sempre ela é tão simples de ser determinada como neste exemplo bobinho do número 6 (ou é 9?). É mais comum ter a referência difícil de determinar. E é por isso que opiniões divergem tanto. Se as referências não são as mesmas, dificilmente as opiniões irão convergir. E é por este motivo que ouvir e tentar entender a opinião de outra pessoa é um passo importante para o crescimento cultural de uma pessoa. A palavra de ordem é: aprendizado.

Se você toma sua referência como verdade e decide não ouvir outras opiniões, o que você está fazendo, na verdade? Você está impondo seu ponto-de-vista e ignorando fatos novos que outros pontos-de-vista podem trazer à luz da discussão e que poderiam levá-lo ao aprendizado, ampliando ainda mais sua compreensão de tudo o que te cerca. E ao impor seu ponto-de-vista você está se colocando acima do outro, fazendo uso da arrogância.

A arrogância é uma ignorância

Eu tive uma grande dificuldade na minha vida: entender que estou no mesmo barco que qualquer outra pessoa. O meu complexo de inferioridade me trouxe, como efeito colateral, a arrogância e a ideia de que eu era melhor do que outra pessoa. Bem, não sou. Assim, tenho algum conhecimento de causa para falar sobre o que vem a seguir.

Ao impor o seu ponto-de-vista você está sendo arrogante. Simples assim. Você acredita que a opinião do próximo não vale nada a ponto de poder ser livremente ignorada. Pior, provavelmente você ofenderá o próximo com alguma afirmativa como que ideia ridícula, ou você precisa estudar mais sobre o assunto.

Isto é quase como se você exigisse que a outra pessoa fizesse um PhD para poder emitir uma opinião. Quer dizer que é preciso estudar para falar algo sobre? Como eu disse, as nossas opiniões são formadas com base na experiência. O detalhe é que o conhecimento faz parte da experiência, mas é apenas um subconjunto. Uma pessoa com bem menos conhecimento é capaz de ter uma opinião totalmente coerente e bem embasada pela própria experiência.

O fato é que as pessoas deixaram de lado o respeito pelo próximo, coisificando as pessoas através de avatares indeléveis. Ao invés de enxergar que ali há um ser humano, enxergamos apenas a representação digital daquela pessoa, uma coisa feita de bytes. Ignoramos complemente o que esta pessoa passou pela vida, quais os seus medos e anseios. Trata-se de algum descabeçado para o qual não temos o menor tato ao afirmar que é um ignorante, ou um militonto, ou um coxinha, um facista ou qualquer outro adjetivo pejorativo desses que estão cada vez mais comuns nas redes sociais.

Ouvir é uma arte

A coisa mais difícil que aprendi na vida foi ouvir. Ainda tenho dificuldade. Ouvir é uma questão de calar as vozes da nossa cabeça para entender o que o outro está querendo dizer. E ouvir é um ato de aprendizado.

Quantas vezes ignorei a opinião alheia e deixei de aprender com essas pessoas? Talvez poderia ter evitado erros que levaram algumas empresas que eu tive para o buraco. Talvez eu poderia ter evitado vários dissabores… O fato é que isto cai no ramo das possibilidades que não se concretizaram e falar sobre elas é basicamente gastar energia a troco de nada.

Ouvir não quer dizer que você vai concordar com tudo o que te disserem. Ouvir significa que você quer saber mais detalhes e quer entender por que a outra pessoa tem a opinião que tem, mesmo que você não se convença da opinião alheia. Isto pode lhe dar uma nova perspectiva, mesmo que isto não seja suficiente para fazê-lo mudar de opinião. O ponto aqui é o aumento da compreensão, a aprendizagem.