Por que envelhecer no Brasil é uma bosta

Você acha que só as mulheres, o povo LGBT e os negros sofrem preconceito? Experimenta ficar velho, colega! Você entra no distinto grupo de pessoas vítimas do preconceito. Velho lerdo, velho burro. Um dia alguém vai te chamar assim.

Eu ainda não cheguei lá. Estou no que chamam de meia-idade. Em Agosto deste ano chego aos 46 anos de vida. Em 2021 faço 50. Você realmente acha que demora muito? 2021 está logo ali, na esquina. São apenas 4 anos daqui para lá. Isso passa voando.

Na meia idade já começo a sentir o peso que é envelhecer aqui no Brasil. Estou vivendo exatamente o que meu pai viveu quando se aproximou dos 50. Depois que você passa dos 35 anos, ou você se vira para virar diretor de alguma porra ou prepara para ficar sem emprego. Por uma questão de conhecer bem meu perfil, me mantive na área técnica. Pô, eu adoro programar computadores. Sempre gostei. Por que caralhos eu iria me meter a ser gerente de alguma 💩? Só se for para passar raiva, ser incompetente e me estressar.

Eu escolhi ficar desempregado em 2009. Precisava mudar o meu estilo de vida. Já vinha com a ideia de empreender. No entanto, tentei arrumar um emprego na cidade para a qual me mudei. Nada. Ninguém queria contratar um cara com 38 anos de idade. Tudo bem, eu já ia abrir minha empresa. Mas com meu pai não foi bem assim. Em 1990 ele ficou desempregado aos 50 anos. Estava no auge do seu jogo. Já trabalhava na área desde 1971. Já contava com 19 anos de experiência.

Preconceito

Trabalho na área de desenvolvimento de software profissionalmente desde 1994. Ou seja, conto com 23 anos de experiência na área. Já escrevi software numa penca de linguagens, sistemas operacionais, bancos de dados usando diversas tecnologias diferentes. E estou sempre me atualizando. É uma necessidade para quem trabalha nesta área.

Porém, os meus cabelos brancos são vistos pelos mais novos com desrespeito. O velho que não sabe nada. (Já ouvi essa). A experiência é francamente ignorada na cultura do brasileiro. A experiência é o velho. O quente é o novo. E tome preconceito. Nas discussões técnicas que tenho nos grupos de desenvolvimento, vira e mexe ouço gracejos impertinentes. Levo na brincadeira. Afinal, um dia essas pessoas também ficarão velhas e passarão por isso.

Eu entendo os mais novos. Eu já fui jovem. Não nasci velho, porra. A vida ensina. A vida é o professor mais inclemente que existe. Não há piedade. Ou você aprende ou passa a vida levando na cabeça. Ou ambos. Uma coisa que os mais jovens têm dificuldade de entender é que nós, que já passamos de certa idade, sabemos bem como medir os riscos. Mas não por que somos especialistas em análise de riscos, mas por que já levamos na cabeça por não haver medido direito as consequências. Porém, esta experiência não serve. Afinal, é uma coisa pessoal.

O preconceito com os mais velhos é tão foda que um dia desses vi a apresentação de um protótipo que um amigo está desenvolvendo. Este amigo é mais velho que eu. Escreveu o protótipo todo em Python usando a rede de AI da IBM. O protótipo é simplesmente sensacional. Roda num Raspberry Pi e entende seus comandos de voz, como o faria a Siri.

Alguns que viram a apresentação desse cara ficaram pasmos por que ele é um coroa. Como um coroa consegue fazer algo assim com AI? Ainda mais em Python, uma linguagem nova! O cara programou em Cobol, é um dinossauro!

É esse tipo de merda que temos de ouvir.

Fica frio, sua hora chega.

Ah, você acha que aquele coroa que programa é um velho que devia ficar em casa debaixo do cobertor? Me conta essa estória de novo daqui uns 20 anos. Se liga, sua vida profissional vai passar tão rápido quanto a minha passou. Quando assustei, já estava com 15, 20 anos trabalhando na mesma coisa todos os dias.

Provavelmente a cultura estabelecida terá mudado pouco e você será o coroa que programa. E se apresentar algum projeto com alguma tecnologia de ponta, todo mundo vai te olhar como se você fosse um alienígena.

Infelizmente você, como todo mundo, vai chegar no melhor do seu jogo depois que tiver vários anos de experiência e maturidade.